Em 2015 necessitamos mais C8H11N

Gordon Gekko -fictício especulador financieiro dum conhecido filme-, recomenda a umha amante que “nom se apaixone” pois, considera que ambos som iguais, “o suficientemente listos para nom caírem nesta armadilha tam antiga do amor, um invento para que as pessoas nom se lancem pola janela”.

Por Carlos Morais | Compostela | 08/01/2015

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Esta noçom genérica que converte o amor numha simples construçom cultural mercantilizada é compartilhada por pessoas com posiçons progressistas e mesmo por um pequeno setor do movimento feminista. Porém, a história da humanidade nom se pode entender sem a existência do amor, esse intenso vínculo emocional com outro ser(es) humano(s), animais, povos e sonhos com utopias realizáveis.
 
Nom pretendo elaborar um tratado marxista sobre o amor, nem exatamente umha reflexom de classe sobre algo que todo o mundo conhece porque experimentou em maior ou menor grau. Tam só quero transmitir um conjunto de ideias (des)ordenadas que procuravam eclodir há muito tempo no meu interior, mas que por um conjunto de circunstáncias da minha vida até agora nom me atrevim a comunicar. Nom som inéditas nem inovadoras, mas acho adequado divulgá-las agora que começa um novo ano.
 
O amor, contrariamente a certas teses filosóficas idealistas, é algo tangível e material. Amamos algo concreto e fazemo-lo motivados pola satisfaçom e o bem-estar que nos provoca esse sentimento. Nom se ama em abstrato outro ser humano, nem umha pátria e um povo. Nom se ama as maes, as companheiras, os namorados, as irmás, nem as paisagens e os entardeceres crepusculares. Amamos a nossa mae e o nosso pai, as nossas filhas, os nossos irmaos, a nossa companheir@, as terras que nos vírom nascer, os lugares referenciais das nossas vidas, um cam ou umha gata… mas nom qualquer umha. Amamos aqueles seres essencias da nossa existência.
 
Para que as nossas vidas sejam satisfatórias e plenas, necessitamos viver e ser acompanhados de amor. A intensidade da dose é proporcional à nossa felicidade.
 
Um ser sem afetividade é um ser com enormes carências, com dificuldades para atingir a satisfaçom com um mesmo, o conforto e o equilíbrio interior. Esse centro de gravidade que nos permite a estabilidade emocional e afetiva.
 
Obviamente “make love” é umha das expressons parciais mais sublimes deste sentimento e desta necessidade que nos reconforta e melhora a nossa situaçom psicossomática.
 
Som múltiplos os amores que um pode conhecer e desfrutar na vida. Nom nos referimos ao “amor de mae” tatuado no ombro, nem aos amores erroneamente riscados de platónicos; tampouco ao simples intercámbio de fluidos ou àqueles baseados em contratos administrativos e/ou sagrados.
 
E sim aos amores da nossa infáncia aos progenitores, aos amores tam intensos como fugazes, aos de conveniência, aos gastos e absurdos, aos clandestinos como os de Monte Pio. Aos amores impossíveis pola carência de reciprocidade, aos condicionados polas incompatibilidades, aos amores ardentes que queimam e pensamos que nunca se apagarám. Aos amores maduros e serenos. Ao amores sonhados, aos genuínos, a esses que nunca poderemos olvidar e gostávamos recuperar. A esse primeiro amor que nunca se esquece e que nom tem porque coincidir com a primeira pessoa que nos provocou suor nas maos, palpitar no coraçom, sensaçons similares à vertigem, voo das borboletas e de bandos de andorinhas no estômago.
 
Aos amores leais e sinceros, que dam mais do que recebem, que entregam sem cálculos, guiados pola satisfaçom de agradar e querer, testados nas adversidades e nos contratempos. Ao que um tuit da passagem de ano descrevia magistralmente: “O amor nom se demonstra escrevendo parrafadas, demonstra-se baixando um radiador desde um 3° sem elevador”.
 
Esse amor guevarista por umha causa, essa qualidade tam difícil de atingir: a ternura da solidariedade entre povos. De “luitar porque esse amor pola humanidade vivente se transforme em factos concretos”, pois “o verdadeiro revolucionário é movido por grandes sentimentos de amor”.
 
Mas este sentimento, esta fantástica sensaçom também pode transformar-se numha perigosa patologia que provoca alteraçons e transtornos no nosso dia a dia. Desordens na avaliaçom da quotidianidade e perda de perspetiva. Adiçons que geram submissons, cessons e concessons.
 
Referimo-nos a esse estado de apaixonamento provocado pola segregaçom de feniletilamina (C8H11N) e dopamina emanada do hipotálamo, que tanto incitam um estado de euforia, de insuperável satisfaçom e alegria, como perda de concentraçom e aceleraçom cardíaca, gerando temores e erróneas idealizaçons.
 
Porque, ao fim e ao cabo, no amor todo é basicamente questom de química e física, de líquidos incoloros, muitos dos quais estám presentes em alimentos como o chocolate, e que tam bons efeitos psicoactivos provocam.
 
A linha divisória entre o amor e o ódio é mui débil e contraditória. Porque há amores que literalmente matam, e há amores intensamente dolorosos, como o vazio que gera a perda irreparável de um ser querido.
 
Ao contrário que Gekko e de toda essa má gente que só ama o dinheiro e o poder, nós vivemos amores intensos, alguns prolongados e serenos, outros breves e ardentes, carregados de turbulências e tempestades. Alguns nom som recuperáveis nem desejáveis, outros inviáveis, outros nom nos deixam dormir bem. Outros vivem em saudades permanentes e lutos imortais.
 
Todos eles fam parte de mim, estám gravados com beijos e carícias nas lembranças que nos acompanham, no coraçom que nos mantem em movimento, e na incomensurável vontade de amar livremente o intenso brilho imenso duns olhos amendoados, as alvoradas da Galiza e a justiça proletária.
 
Neste novo ano que começa, apaixonarmos Galiza e o seu povo deve ser objetivo coletivo prioritário de umha força patriótica e revolucionária. Mas para amarmos o nosso povo e que o nosso povo nos ame, temos que ser capazes de nos querer a nós mesm@s e a quem mais próximo de nós temos.
 
Estendermos umha mao sincera a quem quiger acompanhar-nos nesta tarefa, sem a qual a vida nom fai muito sentido é o melhor objetivo para 2015.

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Carlos Morais Carlos Morais nasceu em Mugueimes, Moinhos, na Baixa Límia, a 12 de maio de 1966. Licenciado e com estudos de doutoramento em Arte, Geografia e História pola Universidade de Compostela, tem publicado diversos trabalhos e ensaios de história, entre os quais destacamos A luita dos pisos, Ediciós do Castro, 1996; Crónica de Fonseca, Laiovento, 1996, assim como dúzias de artigos no Abrente, A Peneira, A Nosa Terra, Voz Própria, Política Operária, Insurreiçom, Tintimám, e em publicaçons digitais como Diário Liberdade, Galicia Confidencial, Sermos Galiza, Praza Pública, Odiário.info, Resistir.info, La Haine, Rebelion, Kaosenlared, Boltxe ou a Rosa Blindada, da que fai parte do Conselho assesor. Também tem publicado ensaios políticos em diversos livros coletivos: Para umha Galiza independente, Abrente Editora 2000; De Cabul a Bagdad. A guerra infinita, Dinossauro, 2003; 10 anos de imprensa comunista galega, Abrente Editora 2005; A Galiza do século XXI. Ensaios para a Revoluçom Galega, Abrente Editora 2007; Galiza em tinta vermelha, Abrente Editora 2008; Disparos vermelhos, Abrente Editora 2012. Foi secretário-geral de Primeira Linha entre dezembro de 1998 e novembro de 2014. É membro do Comité Executivo da Presidência Coletiva do Movimento Continental Bolivariano (MCB). Fundador de NÓS-Unidade Popular em junho de 2001, formou parte da sua direçom até a dissoluçom em maio de 2015. Na atualidade, fai parte da Direçom Nacional de Agora Galiza e do Comité Central de Primeira Linha.