Somente militei um ano na ANPG (Assembléia Nacional Popular Galega), associação de massas do BNPG (Bloque Nacional Popular Galego), controlada pela UPG (União do Povo Galego), partido de ideologia marxista leninista, que parece que se intenta agachar um pouco, porque um partido destas características dificilmente vende nos nossos dias. Á sua frente esteve quase sempre Francisco Rodríguez, um home mui trabalhador, bom organizador, creio que honesto e que identificou parte da sua vida com a da organização. Este partido pratica o centralismo democrático, que de centralismo tem muito e em democracia anda mais bem escasso, e tem proclividade ás purgas e aos processos de clarificação, e, por tanto, ao exclusivismo e ao férreo controle dos associados.
No ano que militei na ANPG, encomendaram-me um escrito sobre língua para um trítico, que realizei em tom irônico, mas, á hora da publicação observei que mo cambiaram eliminando a ironia e deixando-o descafeinado e insulso. Nunca pude saber quem era a mão invisível e misteriosa que realizava estas censuras, nem, naturalmente, ninguém me comunicou quem o fez e por quê. Mas o que me impulsou a deixar a organização foi a leitura na imprensa a primeiros de maio do ano 1981, quando assistia em Poio ao I Congresso da AELG (Associação de Escritoras e Escritores em Língua Galega), duma notícia na que se dava conta purga de destacados militantes nacionalistas, entre eles, Manuela Freguela, Branhas, Manolo Dios, ... Na seguinte reunião local que tivemos em Santiago entreguei um escrito no que lhe comunicava que eu não podia militar numa organização que expulsa a pessoas como as indicadas. Uns dias mais tarde, encontrei-me a rua Alfredo Branhas de Santiago, a Paco Rodríguez e a outro militante, e comuniquei-lhe a minha desconformidade com esta atuação e que não entendia como se expulsava a pessoas destas características. O acompanhante de Paco respondeu-me que “está visto que sempre que houve conflito medramos”, ao que lhe respondi que “se atuais com esses critérios, pouco tenho que dizer”. Sempre pensei que uma organização política tem que ser inclusiva e não depuradora. A partir desse momento, converti-me num espectador do devir político, concentrei-me muito na minha atividade docente desde um prisma galego e nacionalista, ao tempo que participava em quase todos as manifestações que se fizeram na defesa da nossa identidade coletiva. Nunca lhe guardei nem lhe guardo rancor a ninguém.
Creio que a história do BNG pode resumir-se em clarificações periódicas, purgas, e, se os purgados amostram capacidade de resistência e adquirem relevância social, recomposição de novo do espaço político e/ou sindical afetado. Quando uma organização satélite do BNG adquiriu força e protagonismo social, se não é controlada pelo partido hegemônico vai ter problemas, do qual é um claro exemplo o que aconteceu no SLG (Sindicato Labrego Galego) e na INTG (Intersindical Nacional de Trabalhadores Galegos). Creio que se deixaram muitos cadáveres nas valetas e muitíssimas pessoas desencantadas e desiludidas. Creio que era já em 1981 quando se falava de re-fundar o BNPG.
No 1982 a ANPG, UPG, PSG e independentes fundam o atual BNG, que gira em torno a Paco Rodríguez como organizador e controlador não só da UPG senão também do BNG, e a Beiras como presença mediática e protagonismo eleitoral, e esta simbiose, quando se abriu a mais setores, logrou os maiores êxitos para o BNG chegando a converter-se na segunda força galega no ano 1997, com 18 deputados. Tanto Paco Rodríguez como Beiras sentiam-se cômodos nas suas respetivas funções: um satisfazia o seu anseio de controle, e o outro com o seu protagonismo social exitoso colmava o seu narcisismo pessoal, e sentia-se mui cômodo em que outros realizassem o trabalho organizativo, sem querer dar-se conta que lhe estavam preparando a sua tomba política, especialmente após ter descabeçado o Beiras o partido Esquerda Galega, que ele mesmo fundara. Parecia que o governo da Xunta estava ao seu alcanço nas eleições do ano 2001, mas, a forte campanha mediática em contra de Beiras, ao que se tachava de desequilibrado, e da organização saldou-se com um retrocesso de dous pontos de apoio eleitoral e um deputado. Paco Rodríguez considerou que chegara o momento de prescindir do indômito Beiras, que se vê obrigado a ceder a portavozia a Anjo Quintana em novembro de 2003. Alguns membros do BNG me têm confessado que tiveram o seu grande êxito a esta altura fora o relevo de Beiras, do que eu dissentia profundamente, e assim lho manifestei a membros do BNG. Eu considerava que um político que foi capaz de protagonizar um incremento tão notório do apoio ao BNG não pode ser despedido por uma baixada discreta do apoio eleitoral, e isto foi o que lhe transmiti no seu momento a Manolo Portas, que também coincidia com a minha posição.Também discordei muito acerca da política de pactos com o PSOE, sócio que nunca considerei leal, que eu qualifiquei ante membros do BNG, de câncer para esta organização, mas que incompreensivelmente em certos momentos foi tido em grande consideração pelos nacionalistas do BNG. Considerei também, no seu momento, que foi improcedente que o Fraga fosse convertido por Beiras, por arte de berloque, de demo em anjo da noite para a manhã, quiçá para salvar um pouco a sua posição com novas iniciativas. Uma cousa é que se chegasse a certos acordos e outra mui distinta são aqueles abraços e louvores que não iam a nenhures.
As medidas de Quintana de restar-lhe protagonismo a Beiras, para que não eclipsasse o seu liderado, provocam a atitude de Beiras de negar-lhe o apoio a Quintana e de socavar a sua chefia, e em criticas cada vez mais ácidas e mordazes contra a direção do BNG, que se traduzem numa guerra aberta e declarada entre ambos. A crispação e a luta interna incrementa-se paulatinamente e cristaliza em 2012 com o abandono do BNG por parte de Mais Galiza e Encontro Irmandinho. A organização matriz do nacionalismo acode uma vez mais ao lema da clarificação, preâmbulo habitual das purgas, e não foi capaz ou não teve vontade de integrar aos discrepantes.
Estas purgas internas não foram exclusiva do BNG, senão que também uma das suas filhas, Anova, herdeira de Encontro Irmandinho, recorre a elas e não foi capaz de integrar o setor proclive á coligação com os nacionalistas e o setor que pretendia coligar-se com Esquerda Unida, uma organização espanholista, vencendo esta última alternativa, se bem há que reconhecer que teve inicialmente um importante êxito eleitoral, ultrapassando ao BNG em número de escanos: 9 frente a sete em 2012. Por tanto, se medimos as decisões em termos pragmáticos, de rentabilidade eleitoral, cumpre aceitar que tinham razão, mas de seguida, como pudemos constatar, esse invento terminou como o rosário da aurora.
No 2015, surgem as famosas coordenadoras: Iniciativas pela União e Encontro por uma Maré Galega. Eu participei na primeira por considerar que devia contribuir a reforçar o polo nacionalista numa eventual confluência. Foi um autêntico esperpento que, quando estávamos esperando que ambas coordenadoras se reunissem em procura dum acordo a partir da unidade popular, aparece nos meios a notícia dum acordo entre as cúpulas de Podemos, Anova e IU, para ir juntos ás eleições, fechando-lhe o passo, de fato, ao BNG. Eu apoiei a coligação Nós, Candidatura Galega, por coerência, se bem não estava convencido das suas possibilidades de êxito, entre outras cousas, porque os membros da coligação não tinham entidade suficiente para criar entusiasmo de nenhuma classe.
Agora parece que Em Maré Podemos, após o seu êxito nas gerais do 20 D, está interessada em tender-lhe a mão ao BNG, para criar a grande coligação que permita neste ano relevar ao PP no governo da Xunta de Galiza, mas também parece que um setor importante do BNG, incluída a UPG, não está pelo labor, e, como sempre, é possível e provável que triunfe esta alternativa. Creio que seria um erro importante, porque o BNG, neste momento, não está em posição de competir eleitoralmente com umas mínimas probabilidades de êxito. Por outra parte, é tal o deterioro das instituições que não é possível esperar a uma futura recuperação, que, em todo caso, para tarde mo fiais. Uma cousa é o que pensamos que, teoricamente, é melhor, e outra o que podemos fazer neste momento histórico. É evidente que esta opção também implica riscos, mas também oferece grandes possibilidades de mudar as cousas, e cumpre nos momentos decisivos ser atrevidos e valorosos, tendo em conta, ademais, que a alternativa pode ser destrutiva para a própria organização.
O que tem que examinar o BNG é porquê se produziu essa perda constante de apoio desde o ano 1997, e porque as diversas medida adotadas não lograram reverter a situação. A UPG deve refletir sobre a conveniência de seguir controlando a organização porque o que está conseguindo é que nada se mova nem respire. Se confronta o que lhe está passando a organizações como IU, com uma estrutura comparável, deveria ver que esse não é o modelo. Creio que o nacionalismo padeceu ab origine o síndroma infantil do esquerdismo, apresentando-se como a organização mais esquerdista do espetro político, mas isto pode ter predicamento em conventículos de iluminados, mas não logra incidir na maioria social. Podemos entendeu perfeitamente que, para ter êxito, não pode escorar-se á extrema esquerda, senão que tem que ocupar um espaço não mais radical que o do PSOE, que é onde pode captar uma maioria social. Nem IU nem o BNG podem aspirar a liderar um governo desde a extrema esquerda, se bem o do BNG é principalmente de palavra e não, até o momento onde governou, nos fatos, quando poderia ser quiçá ao revés. Isto volve-o também vulnerável á hora de pautar, porque qualquer aspirante a coligar-se com ele, sabe que o seu eventual sócio não tem outra saída que o pacto com a sua organização.
O BNG tem que fazer câmbios de grande calado, e um dos urgente, é o de terminar duma vez com a bicefalia UPG versus direção oficial. A UPG é um partido mui disciplinado e trabalhador, mas também sumamente exclusivista, e, segundo a minha impressão, todas as decisões são pre-cozinhadas e preparadas na cúpula deste partido antes de ser transmitidas ao oficialismo e as bases. Qualquer dirigente oficialista se vê constrangido por umas decisões prévias que contam com o apoio de antemão duns oitocentos membros disciplinados e dispostos a impõe-las aos demais. Por outra parte, isto cria uma dicotomia entre decisões e responsabilidade. As decisões tomam-nas uns e as responsabilidades têm que assumi-las outros, de tal modo que o fracasso dumas políticas nunca se atribuem a aqueles que as parem.
Vemos também que o BNG perdeu o apoio dos setores mais dinâmicos e juvenis da sociedade, e se perdes tanto a mocidade como os setores mais inquietos da sociedade, pouco podes fazer. Há que afrontar a realidade e não tapar os olhos e considerar que não vai conosco. Aliás, detectamos que o BNG se converteu historicamente num cemitério de cadáveres, e parece que um cadáver mais, seja por suicídio ou homicídio, é a do próprio Vence, o melhor líder, o mais capaz e preparado, que entrevejo hoje na nossa Terra. É improcedente que setores da velha guarda, como Batista Álvarez, se atrevam a insultar e pôr em questão a sua valia, questionando a renovação e indicando que “haverá que retirar-lhe timão de mãos dos grumetes”. É igualmente inaceitável que se critique uma campanha por detalhes totalmente anedóticos e que não repercutem quiçá nem positiva nem negativamente, faltando-lhe ao respeito aos candidatos que se apresentaram. Nos comícios que presenciei, considero que o fizeram francamente bem, e que mereciam um mínimo de respeito. A ver agora onde toda os pilotos expertos e candidatos com mais valia, que o único destino que lhes fica é queimar-se na fogueira duma organização que já tem acendido demasiadas piras políticas e, precisamente contra uns sócios que foram sempre modelos na sua entrega e trabalho desinteressado. Com estes prelúdios, o fracasso nas próximas eleições creio que está servido, e que o insulto e/ou o mero voluntarismo não será, nem muito menos, um antídoto eficaz.
De nada serve botar-lhe a culpa dos próprios males á perfídia dos demais, nem á democracia televisiva, porque, entre outras cousas, essa é a realidade com a que temos que lidar, e o que urge é cambiar o governo para conseguir também uma televisão menos manipuladora e mais veraz. É desde o governo desde o que se podem tomar medidas para solucionar as cousas, e não com organizações condenadas a contemplar o devir político e a conformar-se com a queixa constante.