Por admin | Compostela | 01/02/2025
Por Suso Samartinho
1. Dia de Ano Novo: O colosso em chamas
2. CHUP-CHUP
1. Dia de Ano Novo: O colosso em chamas
2025, declarado “Ano Castelao” pola 'Xunta de Galicia' com motivo do 75º aniversário da morte d'O Profeta, começou forte. 'Heavy metal'!
Era por volta do “meio-dia” e eu estava na casa dos meus pais, prestes a sentar à mesa para, junto com eles, dar conta dum almoço de Ano Novo que já estava servido e à sua espera (naquele preciso instante papá e mamá estavam cada um no seu estremo da casa a fazerem qualquer cousa). De repente, pola janela da sala de jantar vejo uma coluna do que eu, por uma décima de segundo, julguei ser pó. O pó levantado por um desabamento do terreno –produzido pola natural erosão da linha de costa– como aquele de que eu próprio tinha sido testemunha quando era pequeno. Um pó que passava de castanho escuro e era quase preto. Peguei no telefone para gravar um vídeo do histórico evento e, num momento, o pó que não era pó mas fumo virou negro como a noite. No vídeo, de 9 segundos de duração e gravado por mim às 13h36 (CET) ouvem-se em off (fora de plano) as vozes da minha mãe e mais a duma moça a quem eu ainda não conhecia e tinha sotaque forasteiro:
Mamá: “Que passa!?
A Moça : “Ayuda!!! Bomberos!!! Se nos quema la casa!!!”
Mamá: “Cômo?!?”
A Moça: “Bomberos!!! Rápido!!!”
Assim que compreendi a realidade da situação, parei imediatamente de gravar o vídeo e liguei para o 112 (o número das Emergências da Galiza).
Um aparatoso incêndio tinha deflagrado no porão do “emblemático edifício”[1] de apartamentos 'O Penedo', propriedade duma família vizinha, muito querida e de toda a vida amiga nossa. Um edifício em que, já agora, foi escrito 'O' não menos emblemático 'Atraso Económico na Galiza'[2], do grande Xosé Manuel Beiras. “Amigo meu dende picariño”, como O'Beiras escreveu na dedicatória que, para mim, teve a gentileza de estampar no meu exemplar de, precisamente, 'O Atraso').
E um edifício que, dito seja de passagem, aparece mencionado também em “Sempre Em Waikiki” (SEW), o meu primeiro livro (a solo). Concretamente no apartado 1.2. do capítulo 1 (“Assuntos Religiosos”) do livro terceiro (“Ka Puke Kolu”), intitulado “Por uma [Igreja da] Galiza Liberada”:
“O título deste capítulo é, com efeito, uma paródia do 'Por unha Galicia Liberada', mangado de “ensaios em economia e política” escritos polo Grande Xosé Manuel Beiras e datado no lugar do Penedo, em Bueu, em 1984. Naquela altura –fê-lo durante toda a minha infância e adolescência O'Beiras veraneava no edifício de apartamentos denominado O'Penedo, vizinho à minha casa parental e que estou a ver da minha janela agora mesmo enquanto isto escrevo." (pág. 180).
Com reminiscências aos atentados do 11-S contra as nova-iorquinas Torres Gêmeas, um evento que mudou Mundo[3] para sempre, a imagem do colosso bueuês em chamas[4][5] comocionou todo o mundo –onde o mundo se chama 'Puebla Nueva del Conde'[6] –, e deu a volta à Galiza.
Depois do acontecido, depois do seu catastrófico início, o Ano Novo 2025 só poderia melhorar... Pensávamos nós ingenuamente.
2. CHUP-CHUP
Quarenta e oito horas mais tarde, na sexta-feira 3 de janeiro, depois de ter passado duas noites e um dia de cães –c'uns calafrios espasmódicos e irrefreáveis, muita dor muscular e um mal-estar geralizado– encontro-me no Centro de Saúde de Bueu, aonde tinha ido por Urgências.
Perante a impossibilidade física de percorrer a pé uma distância que normalmente me leva apenas quinze minutos –a barriga ou batata das duas pernas, as panturrilhas, doiam-me como se na noite de Ano Velho tivesse ido correr a corrida de São Silvestre–, em vez de ir «en el coche de San Fernando, un ratico a pie y otro ratico andando», fui no carro do Samartinho. No meu velho 'Seat Ibiza' preto. Apesar de que o simples gesto de virar o volante para apanhar à direita ou à esquerda já me provocava terríveis dores, graças a São Cristóvão (da Lícia), consegui ir e voltar são e salvo. Bom, digamos que consegui ir ao médico (onde me fizeram várias provas) e voltar para a casa (com a minha medicação) sem maiores incidências.
Mais vinte e quatro horas depois de ter ido ao Centro de Saúde de Bueu por Urgências, no sábado 4 de janeiro e devido o pioramento do meu estado de saúde, estou deitado na cama 2 do quarto 204 (Reumatologia), no segundo andar do Hospital Provincial de PonteVedra (CHUP), aonde tinha chegado de ambulância de madrugada. O mesmo hospital onde a minha mãe me tinha dado à luz havia 53 anos 3 meses e 2 semanas (-1 dia). E também cenário do crime cometido contra a colega de quarto da minha mãe, a quem foi vilmente roubado o bebé que acabava de parir. Alguém que, se não nasceu morto/a –como lhe assegurou a equipa médica à coitada da recém-parida– nem morreu novo/a –antes dos 53 anos–, hoje terá a minha mesma idade. Conta a minha mãe que, segundo a ela lhe contou a sua colega de labores de parto e de quarto por sua parte, os médicos se recusaram a mostrar-lhe o “natimorto” porque, segundo eles, tinha nascido com horríveis deformações. A minha mãe dizia-lhe que ela insistiria em poder vê-lo na mesma, mas... Enfim, estarrecedor!
Quatro dias depois, na quarta-feira 8 de janeiro, eis o susodito deitado na cama 1 do quarto 602 no sexto andar (Medicina Interna) do Hospital de Montecelo (CHUP-CHUP), centro hospitalar público inaugurado em 1973 na paróquia de Mourente onde, na sua tenra infância, tinha sido intervido cirurgicamente[7] duma fístula branquial no pescoço[8]. “Montecelo do teso cume que olla de lonxe! Eiquí síntese ben o pouco que é un home…”
Uma semaninha inteira depois, na quarta-feira 15 de janeiro, a jovem e super-atenta Doutora Irea[9] deu-me por fim a anseiada alta médica. E, além disso, deu-ma em galego. Podia ir em Paz. Finalmente.
Safei de milagre! E esse milagre chama-se Serviço Galego de Saúde (que é o nome que no antigo Reino da Galiza recebe o sistema de saúde pública), autêntica jóia da coroa! O Suso não morreu! Viva o SUS[10] ! Aliás, viva o SNS![11] Aliás, viva o SerGaS!!!
Graças à rápida e eficiente intervenção médica e aos constantes e vitais cuidados das enfermeiras –de ambos sexos mas, maioritariamente, enfermeiras– pude sobreviver ao temível meningococo.
Parece-me impressionante que um coletivo tão maltratado polo mau governo galego, que faz o seu labor numas condições de trabalho tão precárias, seja capaz atender e cuidar as/os doentes galegas/os com tanta Humanidade e excelência. A mesma Humanidade que falta aos sociopatas que, uma e outra vez, são eleitos por maioria absoluta com os votos das/dos pacientes galegas/os para que as/os mal-governem. As salvas de palmas e as manifestações estão muito bem, mas a Saúde Pública defende-se votando, minha gente!
Afinal, graças aos litros de antibióticos em veia, o menigococo não me comeu o coco e a cousa não passou duma poliartrite, que já lhe chegou de c*****o! Podia ter acabado em meningite e ter acabado comigo como acabou com a pobre Luísa Villalta[12].
Apesar de quase ter deixado a vida na tentativa –não me custou a vida mas sim a saúde mental, a sanidade e, o que é mesmo pior, um monte de quartos!–, após quatro longos anos à procura dum editor ou editora valente a quem não se lhe atravesasse o meu mecanoscrito, no ano passado (2024) e sob o carimbo editorial da 'ToxosOutos', consegui por fim dar a lume o meu primeiro livro. Este livro, intitulado 'Sempre Em Waikiki' (SEW), como dissemos – e subtitulado 'Memórias Havaianas dum Soberanista Galego'– converte-me oficialmente em “escritor” e –junto com um ou outro texto que tenho por aí disperso– teria feito de mim um excelente candidato a ser o autor homenageado pola Real Academia Galega (RAG) no Dia das Letras Galegas 2035, em triste caso de óbito. Bom, talvez no do ano 2045, por aquilo de eu ser 'reintegrata'.
NOTAS DE RODAPÉ:
[1] ÁLVAREZ, Julio: "Impresionante incêndio en un emblemático edifício de Bueu", "Faro de Vigo", 01/02/2025 [farodevigo.es/fotos/o-morrazo/2025/01/01/impresionante-incendio-emblematico-edificio-bueu-113049687.html].
[2] Xosé Manuel Beiras Torrado: “Veñen de se cumplir corenta e oito anos dende o vran no que escribira O atraso no Can do Penedo de Bueu. Morfolóxicamente, todo mudou entre a Galiza que eu tentei ‘retratar’ hai cinco decenios e a de arestora. [...] No cerne da cuestión: deixou Galiza de ser unha colonia interna da formación capitalista española, ou simplesmente pasou a ser tal a respeito da Unión Europea, e o Estado Español un ‘protectorado’ dela?.” [laiovento.gal/CATALOGO/131/O-ATRASO-ECONOMICO-DA-GALIZA-4-ed.html].
[3] “In observance of the anniversary, BU Today reached out to faculty across Boston University—experts in international relations, international security, immigration law, global health, terrorism, and ethics—and asked each to address this question: “How has the world changed as a result of 9/11?” [“by BU Today staff”, “BU Today”, 08/09/2021, bu.edu/articles/2021/how-9-11-changed-the-world/]. “BU.EDU”??? Serious??? I can't believe it!!!
[4] “The Towering Inferno (br: Inferno na torre / pt: A torre do inferno) é um filme estadunidense de 1974 dirigido por John Guillermin e Irwin Allen e com roteiro baseado nos livros The Tower, de Richard Martin Stern, e The Glass Inferno, de Thomas N. Scortia.” [pt.wikipedia.org/wiki/The_Towering_Inferno].
[5] “The Towering Inferno —titulada en Hispanoamérica Infierno en la torre, y en España, El coloso en llamas— es una película estadounidense de catástrofes, acción y drama de 1974...” [es.wikipedia.org/wiki/The_Towering_Inferno].
[6] Nome dado à Vila de Bueu polo Laureado Gonzalo Torrente Ballester (LGTB) –natural de Ferrol mas bueuês como o que mais (Q+)– na fição de “Los Gozos y Las Sombras”.
[7] Deste doloroso episódio auto-biográfico falo no sub-apartado 5.4.7. “Waterworld” (págs. 122-124) do apartado 5.4. “Kamehameha & Jesus Cristo: dous meninos e um destino” do capítulo 5. “Kamehameha I 'o Grande'” do segundo livro “KA PUKE LUA (LIVRO II)” de “Sempre Em Waikiki” (SEW), em que reproduzo –convenientemente traduzida para o galego-português do seu inglês original–, a composição que Eleanor Svaton, a nossa professora de 'Communication' na 'Global Village Hawaii' (Honolulu), pediu à minha turma sobre as nossas “earliest childhood memories”, quer dizer, as nossas mais antigas lembranças da infância.
[8] “As fístulas branquiais no pescoço são uma condição rara e muitas vezes desconhecida, que pode causar desconforto e preocupação para aqueles que a experimentam. [...] Uma fístula no pescoço, também conhecida como fístula faringocutânea (FFC), é uma abertura na mucosa faríngea que permite que a saliva extravase e se comunique com a pele. [...] Uma fístula branquial no pescoço é uma abertura anormal que se forma durante o desenvolvimento embrionário, conectando a garganta à pele. [...] Felizmente, existem várias opções de tratamento disponíveis para lidar com essa questão de forma eficaz. Desde medicamentos até procedimentos cirúrgicos […].” [RODRÍGUES, Lucio: "Fistula branquial no pescoço: diagnóstico e tratamento", "The Viking Challenge", 16/04/2024, thevikingchallenge.pt/blog/fistula-branquial-no-pescoco/?accettato=1].
[9] "Irea é un nome propio feminino galego. A súa orixe é o grego Eirḗnē ('paz', 'deusa da paz'), adaptado ao latín como Irene. En galego tamén ten as variantes Irene, Irena, Eirea e Erea." [gl.wikipedia.org/wiki/Irea].
[10] “Sistema Único de Saúde (SUS) é a denominação do sistema público de saúde brasileiro" [pt.wikipedia.org/wiki/Sistema_Único_de_Saúde].
[11] "O Serviço Nacional de Saúde (SNS) é o organismo encarregue do sistema de prestações de saúde públicas no território continental de Portugal." [pt.wikipedia.org/wiki/Serviço_Nacional_de_Saúde].
[12] Por favor, leia-se esse ele duplo do apelido da escritora e violinista como se ele fosse um ele simples. Como em 'cello' ou 'violoncello'. Como, por exemplo, os apelidos do Heitor Villalobos ou o Marcos Valle, vale?
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