Os derrotados da crise

Quem ia pensar que a humanidade inteira ia estar num brete por um minúsculo organismo de entre 50 e 70 milimícrones, sendo um milimícron a milésima parte dum mícron, e este a milésima parte dum milímetro, o qual indica que o milimícron é a milionésima parte dum milímetro...

Por Ramón Varela | Ferrol | 12/04/2020

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Pois bem, um bichinho desse tamanho é o que tem acurralado os maiores poderes militares da história, com um ingente arsenal militar que é capaz de destruir a todos os seres viventes muitas vezes. Isto indica que as armas que amontoam as grandes potências militares não são idôneas para combater os maiores inimigos dos nossos dias do ser humano e doutros vertebrados; os maiores inimigos não são os outros seres humanos, nem os outros povos, nem muito menos os animais, senão os seres minúsculos que não podemos detectar com os nossos órgãos dos sentidos, e que não se podem matar a canhonaços nem com bombas atômicas, apesar de que a Trump lhe parece que elevando o gasto militar a um quatro por cento do PIB, já tem todo solucionado. Isto só serve para empobrecer a humanidade e fazê-la dependente das armas que fabricam os EEUU, China...

Uma vez passada parte da primeira investida desta pandemia já temos um grande derrotado, que é o liberalismo econômico e político, que se condensa na frase: “laissez faire, laissez passer, La vie va de lui-même” (Deixai fazer, deixai passar, a vida marcha por si mesma). Como dizia Adam Smith, a economia é guiada por uma mão invisível que a conduz ao melhor resultado, se se evitam as interferências exteriores, mão invisível que se identifica com o mercado, convertido no grande fetiche da economia capitalista. E tem razão, porque isto leva ao melhor resultado a curto prazo para alguns, para os que manejam os fios do sistema: amontoam dinheiro a mãos cheias e põem-no a bom recato em paraísos fiscais. Como vemos, funciona formidavelmente, mas para alguns, enquanto que os outros se empobrecem. Por algo Aznar dizia faz pouco tempo: se a gente não quer liberalismo, pois mais liberalismo, que se resume bem na frase galega, “se não queres caldo, três cuncas”.

Aos defensores deste sistema, que lhes importa a ciência? Que lhes importa a investigação? Que lhes importa a inovação? Que lhes interessa o câmbio climático? Que lhe interessa uma sanidade pública e uma educação pública e laica para todos? Perguntem-lhe a Trump, a Bolsonaro, a Vox, a Rajoy, a Aznar. Só interessa o que dá dinheiro a curto prazo, o que os beneficia a eles e aos seus amigos. Os políticos espanhóis andaram cacarejando que temos a melhor sanidade do mundo, e resulta que carece dos meios elementares para proteger os seus médicos nem os seus cidadãos. Não tem máscaras, não tem batas, não tem respiradores,... A troika e a Alemanha de Merkel quiseram solucionar a crise financeira com recortes, e com uma falta total de solidariedade com os países afetados. A consigna era: há que ser austero, não há que gastar e sobre todo não há que gastar o que não se tem. Resultado: recortes. No que se esmeraram Zapatero, Rajoy, Feijóo, Mas,... e garantir ante todo que os acredores cobrem ainda que a população não tenha o mínimo vital.

Além do pouco investimento no público (sanidade, educação, residências de maiores, inovação,...) foi derrotada também nesta crise a privatização dos serviços públicos, que se traduziu em corrupção, falta de investimento, falta de preparação e desumanização. Aos que assumem o controlo destes centros só os guia o interesse crematístico imediato. Descende a preparação dos trabalhadores, os salários e a falta de interesse por oferecer um serviço de qualidade. A ideia diretriz é: invisto dinheiro para obter mais dinheiro. O coronavirus cevou-se com os maiores, nomeadamente com os que vivem em residências, que representam o quarenta por cento de todas as mortes por esta doença, delatando a falta de preparação dos cuidadores e, muitas vezes, a sua pouca humanidade e maus tratos dos velhinhos e velhinhas, culpa que não é atribuível prioritariamente aos próprios trabalhadores, senão aos que dirigem o negócio, porque não se podem ter trabalhadores implicados com baixos salários, precariedade laboral, falta de planos de formação, etc.

Traballadores do asteleiro naval Freire con máscara por temor ao coronavirus
Traballadores do asteleiro naval Freire con máscara por temor ao coronavirus | Fonte: @miguelnuñez

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Ramón Varela Ramón Varela trabalhou 7 anos na empresa privada e, a seguir, sacou as oposições de agregado e catedrático de Filosofia de Bacharelato, que lhe permitiu trabalhar no ensino durante perto de 36 anos.